Que dor é essa?
Departamento de Odontologia Restauradora
atualizado 2 meses atrás
O professor Edwin Fernando Ruiz Contreras (Departamento de Odontologia Restauradora) coordena o Programa de Formação Complementar intitulado “Grupo de estudo e extensão em dor orofacial e suas comorbidades”, em execução desde 2019 na Clínica Odontológica da UEL.
O projeto começou a nascer depois do Pós-Doutorado realizado na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) em Araraquara, em 2015, para aplicar sua pesquisa em uma disciplina especial, já que não existe uma específica na grade do curso de Odontologia.
Assim surgiu a disciplina de Oclusão e Dores Orofaciais, oferecida no 3º ano da graduação, que serve de requisito para participar do PFC, no quarto ano. O foco, de acordo com o coordenador, é prestar atendimento à população.
Atualmente, são atendidos entre 100 e 120 pacientes, que podem ficar dois ou três meses em tratamento (às vezes menos) dependendo do diagnóstico.
O sucesso do serviço, indicado pelo Pronto Socorro Odontológico da Clínica, criou uma grande demanda. Edwin diz que há mais de 300 pessoas na fila de atendimento. “O projeto precisa expandir”, resume. E tem feito isso: começou com seis alunos, hoje tem 27. Ainda não é suficiente, mas o professor conta que a adesão dos alunos das respectivas turmas tem sido total.
E por falar em sucesso, o coordenador informa que é o único projeto do norte do Paraná reconhecido pela Sociedade Brasileira de Dor Orofacial (SBDOF). “O que ajuda a gerar mais demanda”, comenta.
Quais dores?
E de quais dores se ocupa o Programa? Por incomum que possa parecer, não é a dor de dente. As mais recorrentes são as chamadas DTMs, ou Disfunções Temporomandibulares, e as cefaleias (dores de cabeça).
As DTMs são dores no maxilar, na mandíbula, na região próxima ao ouvido. Dores sentidas ao mastigar, bocejar, deglutir, ou outras funções corriqueiras. Às vezes a mandíbula estala a cada movimento. E há casos em que apenas tocar as bochechas faz sentir uma dor insuportável.
Dor é sintoma, e suas causas são, segundo Edwin, multifatoriais, principalmente físicas (mecânicas) ou emocionais. Menos comuns, mas possíveis, são as dores resultantes de inflamações na região orofacial ou sistêmicas, isto é, doenças que provocam dores em várias regiões do corpo.
Os tipos de dor também variam. Quando se localizam no tecido muscular, dói como se houvesse ali uma pressão, um esmagamento. Quando é na articulação, a dor é aguda, como se sofresse agulhadas. E há as neuropáticas, quando a dor é acompanhada de sensações desagradáveis, como se estivesse queimando, por exemplo.
O professor explica que, em sua primeira consulta, há uma boa conversa com o paciente, que pode durar até uma hora e meia, para a realização de uma anamnese completa, sobretudo em relação aos hábitos, que influenciam muito.
Casos de dores leves (30%) são resolvidos em questão de dias, desde que o paciente faça sua “lição de casa”, aponta Edwin. Segundo ele, 55% do sucesso do tratamento depende do paciente. Os outros 45% vão depender do dentista, do fisioterapeuta, dos remédios, etc.. Casos cirúrgicos são bem raros: 5%.
Há tratamentos com laser ou acupuntura. Medicar pode ser preciso, mas só depois de uma avaliação completa. De fato, o professor conta que o projeto mais tira do que prescreve medicamentos.
Normalmente, o paciente chega à clínica após ter tomado analgésicos e outros remédios, nem sempre prescritos por médico ou dentista. A primeira consulta também serve para orientar e explicar detalhadamente ao paciente seu problema, causa e terapia.
Nesta dimensão educativa, o serviço ajuda na prevenção e esclarece, combatendo informações sem base científica e lançando a luz da ciência sobre o caso. Um exemplo está nos casos de pressão dos dentes (bruxismo).
Edwin é categórico: os dentes só têm que se tocar na mastigação. Se não estiver comendo, não devem exercer pressão uns sobre os outros. E se engana quem pensa que é dormindo que isso mais acontece. O professor explica que o apertamento em vigília (quando acordado) é muito pior.
Ansiedade e estresse
As causas: normalmente, ansiedade e estresse. Uma das indicações, neste caso, é que o paciente procure fazer uma atividade de lazer que o relaxe. Não necessariamente um exercício físico, que pode deixá-lo ainda mais ansioso ou estressado.
Ouvir música também – tem que ser um estilo que o agrade. Claro que a própria profissão pode não facilitar. Policiais e bombeiros, por exemplo, são frequentes candidatos a dores orofaciais por tensão. A pandemia foi outro fator, aumentando expressivamente o número de casos.
As dores podem estar ainda associadas a doenças crônicas, e não são poucas. As síndromes das pernas inquietas e do intestino irritável são algumas. As “algias” são outros exemplos: fibromialgia, lombalgia, cervicalgia… mas espere! Dor na coluna faz doer a mandíbula? Faz.
Edwin explica que tais doenças crônicas enviam o sinal de dor ao córtex cerebral continuamente, que “se confunde”, o que provoca uma condição chamada de “dor referida”, ou seja, uma dor sentida em local diferente de sua origem real. O professor fala de pacientes que chegaram à clínica com queixa de dor na boca, e os exames nada revelaram. Chegaram a extrair um dente, e nada mudou. O problema não era lá.
Em relação à faixa etária, a mais atingida é a economicamente ativa (20 a 60 anos), em razão da pressão do trabalho e do mercado. Infelizmente, informa Edwin, estão aumentando os casos na infância (7 a 10 anos), e a causa já é bem conhecida: as telas. Excesso de tela significa redução na qualidade do sono.
O organismo humano tem seus horários de liberação de hormônios e outras substâncias, incluindo as do sono, e se intrometer neste ciclo é prejudicial. Ficar até tarde diante da TV ou principalmente do celular faz dormir menos e pior, e sem sono a criança passa a ficar mais tempo diante da tela, criando um círculo vicioso.
Aí vêm o sono diurno, a falta de atenção e concentração e o baixo rendimento escolar. Assim, o professor recomenda: está sem sono? Leia um livro, ouça uma música calma e relaxante – mas nunca uma tela. Vale para adultos também.
Prospectivamente, Edwin quer aumentar o número de pacientes catalogados pelo Programa. Hoje são cerca de 150, mas a meta é chegar a 500. Outra ideia é desdobrar ou transformar o projeto em extensão, visando a creditação (curricularização da extensão) e a obtenção de bolsas para alunos participantes. E há um objetivo maior ainda: criar uma Residência em Dor Orofacial.